Foto: Acervo Pessoal
O que parecia enterrado pela avalanche do conteúdo digital retorna com vigor, propósito e sofisticação. Mais do que um resgate nostálgico, o refortalecimento do mercado de impressos, sobretudo das revistas impressas representa uma resposta concreta à saturação de estímulos, à efemeridade da rolagem infinita e ao cansaço da desatenção.
Como uma fênix editorial, as publicações físicas voltam a ocupar um espaço nobre no mercado editorial mundial. Refinadas, colecionáveis e profundamente conectadas à experiência humana de leitura, as revistas não apenas sobrevivem! Elas reinam com silêncio, presença e valor simbólico em meio ao colapso da atenção cada vez mais escassa e atropelada pela superficialidade.
Desde a ascensão do digital, decretaram o fim das revistas impressas — como já fizeram com o rádio quando chegou a TV, e com a própria TV quando surgiram as plataformas de streaming. Mas o fato é que o mercado é plural e cíclico. E o que parecia superado agora ressurge com mais força, sofisticação e ainda mais significado. Títulos como Saveur, Sports Illustrated, i‑D, Complex e Tablet deixaram para trás o digital como canal exclusivo e voltaram às bancas, muitas vezes em edições especiais, luxuosas ou colecionáveis.
E esse movimento não se restringe ao mercado internacional. No Brasil, revistas como a Capricho (que retornou em formato semestral no fim de 2024), Placar, Moda Moldes, Rolling Stone Brasil e Zupi também vêm retomando o espaço impresso com força total.
Aqui na Let’s Go Bahia, essa aposta aconteceu há mais tempo. Ainda em 2017, quando reassumi a direção da revista e apostei em um modelo editorial de profundidade, curadoria e identidade própria — fazendo da Let’s Go uma revista de conteúdo, sem abrir mão do seu DNA life style. Mesmo contra todas as previsões, e enfrentando inclusive resistências internas, escolhi fazer da Let’s Go uma revista de conteúdo ainda na contramão do movimento da época, quando o digital era tido como o único caminho possível. Hoje, como Publisher, me orgulho do lugar que ocupamos no mercado editorial baiano e do que representamos nessa retomada da força do impresso com alma, com propósito e com visão de futuro.
Mas por quê esse movimento de refortalecimento do mercado de impressos? Por que agora? Por que voltar ao papel num mundo que nos empurra o tempo inteiro para as telas?
As motivações são muitas e profundamente conectadas ao espírito do nosso tempo: a experiência sensorial, a desaceleração da vida digital, o resgate da curadoria e do conteúdo de nicho, o apelo estético e simbólico das edições de luxo, a eficácia da publicidade impressa, a preocupação ética com sustentabilidade e impacto socioambiental, cada vez mais presente na sociedade brasileira, e para surpresa de muitos, o recente e inédito desejo de conexão autêntica por parte da Geração Z são alguns dos diversos motivos que levam explicam esse resgate da força dos impressos.
E os motivos citados acima não são achismos. Foram identificados em pesquisas sérias, recentes e bastante respeitadas, como os levantamentos do Pew Research Center sobre comportamento de leitura, a pesquisa do Publishing Research Consortium sobre retenção de conteúdo em papel versus tela, os estudos da Vice Media Group e McKinsey & Company sobre os hábitos e anseios da Geração Z, além de dados da Nielsen e da Two Sides, que comprovam a força e a credibilidade da publicidade impressa. Fontes que não apenas validam esse movimento como ajudam a entendê-lo com profundidade.
Essas fontes explicam sua profundidade, suas raízes e seu impacto no ecossistema editorial. O relatório “True Gen” da McKinsey deixa claro: a experiência sensorial oferecida pelos jornais, revistas e livros se tornou o primeiro fator preponderante do resgate da força dos impressos.
O papel tem peso, textura, cheiro. Folhear uma revista é um ato que ativa memórias, desperta sentidos e convida à presença. É diferente do toque frio de uma tela. É como tomar um bom vinho em taça de cristal ao invés de tentar degustá-lo em um copo de plástico. O impresso seduz por detalhes que não passam despercebidos e, por isso mesmo, permanecem.
O impresso oferece o oposto dessa avalanche desconcertante do “tudo ao mesmo tempo agora”: oferece pausa. Oferece tempo, foco e confiança! Uma leitura feita com calma, no colo, no sofá, com o celular virado para baixo virou quase um ato terapêutico. É um verdadeiro gesto de sanidade.
Associada a essa dimensão sensorial está a desaceleração digital. Nunca estivemos tão exaustos de tanto estímulo, interrupções e tanta superficialidade. Pior que isso: estamos exaustos de tanta mentira. De tanta fake news. E que coisa estenuante e assustadora é ter que buscar a verdade, sozinhos, em meio a esse mar de mentiras e informações infundadas!
A curadoria e o conteúdo de nicho também ajudam a explicar esse novo fôlego. Em meio ao excesso de informação solta, sem critério, sem contexto, sem alma e, sobretudo, sem a devida apuração, o público passou a valorizar, mais do que nunca, o olhar de quem seleciona, organiza, pensa, apura e entrega algo com sentido, com seriedade e com verdade. Publicações especializadas em moda, arte, gastronomia, política, arquitetura e tantos outros universos vêm reconectando comunidades inteiras em torno de relevância e seriedade. Mais que isso: vêm reconectando as pessoas à verdade. À notícia apurada. Ao conteúdo que realmente importa.
E a verdade é que isso sempre foi assim e deve permanecer assim. Mas a velocidade e a promessa de volume em detrimento da qualidade seduziu a todos e fez com que esquecessem o valor da curadoria. Muitos se deixaram levar por essa onda atraente que promete tudo muito rápido mas que também não consegue sair do limbo da superficialidade. Agora, ao que tudo indica, a memória desse valor está on. Está de volta ao centro da conversa.
E não é só isso: o objeto em si importa. Mais do que a velocidade com que chega, importa o que o conteúdo de fato representa. Revistas bem feitas são obras. Decoram mesas, prateleiras, escritórios. Viram presente, referência, lembrança. São itens de luxo e, como todo objeto de luxo, despertam desejo. As pessoas querem beleza. Querem colecionar, guardar, revisitar. E uma revista bem feita, um impresso bem feito, com acabamento gráfico refinado, se torna peça de valor. Uma espécie de cápsula do tempo com estilo, uma vitrine!
Para as marcas, a volta da força do impresso também representa um reencontro com a eficácia. Anunciar em uma revista bem feita é entrar num ambiente sem ruído. Não há distrações, pop-ups, notificações. Há atenção. E atenção, hoje, é ouro. A publicidade impressa tem mais tempo de exposição, mais confiança e mais retenção, algo comprovado pelas pesquisas da Nielsen e da Two Sides. Anunciar em impresso é aparecer com destaque e não se perder no caos do digital.
Por fim, há ainda o propósito. O olhar para o planeta. Porque sim, já é possível (e há bastante tempo) imprimir com responsabilidade usando papel certificado e tintas ecológicas, contratando gráficas que trabalham com replantio. Aqui na Let’s Go, por exemplo, só imprimimos em papel certificado. A sustentabilidade está no nosso radar e com certeza, no radar dos nossos leitores.
Ou seja: o que parecia ultrapassado, virou símbolo de uma nova forma de consumir conteúdo. Mais clássica, mais consciente, mais permanente. Os impressos fortes outra vez e as revistas estão na crista da onda novamente voltando com força total. Não como eram antes. Estão voltando melhores. Com alma, com propósito e com visão de futuro. Como uma fênix. E não é exagero dizer que o futuro, talvez, passe de novo pelas bancas.