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Edição esgotada

Edição esgotada
Remulo Farias

Remulo Farias

17/04/2021 1:45pm

"Dançar conforme a música", "amarrar o burro conforme a vontade do dono", "saber onde as cobras dormem"; levei a vida inteira ouvindo citações deste tipo para justificar desacertos e derrotas de alguém como se numa alusão a ensinamentos advindos de um compêndio mágico que imuniza a quem dele detém os ditames as "regras do jogo".

O problema está no fato de que, se é que tal livro já foi escrito, tal publicação deve ter sido elaborada numa quantidade ínfima, de distribuição seleta e restrita e com edição esgotada já há bastante tempo.

E pelo visto, quem possui tão rara publicação mantém guardada sob "sete chaves", escondida do mais íntimo dos personagens a fim de não ter que dividir conhecimentos tão sábios a respeito de como se chegar a vitórias.

Que me desculpem os autores de auto-ajuda, mas, vocês não estão com nada se não basearam as suas orientações em alguma edição de tão preciosa jóia da literatura; pelo que ouço dizer, ali sim é que estão as verdadeiras lições para se vencer na vida, para se evitar ou minimizar as possibilidades de erros.

Tem mais; tal publicação deve ser de tamanha complexidade para entendimento que se contrapõe à própria inocência natural (natural?) do ser humano e com ela não admite se misturar, ou então, de onde será que surgiu a citação: "ele é inocente, não conhece as regras do jogo".

É possível que observando e refletindo sobre acontecimentos do dia-a-dia se consiga inferir sobre o que contém tal publicação a partir de conclusões tais: com raríssimas exceções, as "regras do jogo" não são passadas de pai para filho, daí a citação "pai rico, filho esnobe, neto pobre"; tais regras devem ter algo com o "ganha-perde" porque sempre se atribui ao perdedor a pecha de que ele não conhecia "as regras do jogo" - se ambos as conhecessem seria o "ganha-ganha"; tem caráter extremamente egoísta já que não faz parte do currículo normal de nenhuma instituição de ensino e nem é transmitida na educação doméstica.

"As regras do jogo" têm algo de misterioso, profano, perigoso etc. pela maneira com que se faz referência às mesmas nos ambientes sociais - falando em voz baixa, com olhares fortuitos para os lados, com reservas e, somente, na presença de conhecidos; de conhecidos bem conhecidos; ou melhor, de participantes.

Porém, já que a edição está esgotada e ninguém empresta e nem ensina "as regras do jogo" acho que a única maneira de as aprender é apreciando aqueles que conhecem a teoria e a prática de tal assunto, para por apreciação e imitação, tentar acertar na aplicação de tais "técnicas?"

Uma outra opção é se recolher ao isolamento total, de tudo e de todos, para não precisar jogar. Nesse caso tenha o cuidado de bisbilhotar bastante o novo cenário; pode ser que também no mundo animal exista uma versão específica para "as regras do jogo"; com diferenças, apenas, no que diz respeito a ética, moral, princípios e valores.

Deve haver alguma outra solução para se aprender essas regras. A questão é que, acredito, somente quem conhece "as regras do jogo" sabe o que é preciso fazer para conseguir a revelação dessas.

E pensar que estamos vivendo um momento em que cada vez mais se fala de Seres Humanos, Ecologia, Solidariedade, Trabalho em Equipe, Relacionamentos, Integração, Energização, Qualidade de Vida, Eco Isto, Eco Aquilo, e outras denominações de caráter humanista. Nesse cenário, falar de um conjunto de normais comportamentais que não podem ser transparentes, abertas é, no mínimo, estranho, antagônico, para não dizer inaceitável.

Se você não tem um exemplar procure quem tem mais de um ou descubra quem aceita emprestar para tirar cópia; de outra maneira será impossível conhecer o conteúdo de tal publicação e "se dar bem".

Será?

Uma coisa é certa: essa é uma publicação com "EDIÇÃO ESGOTADA".

E quem não estiver satisfeito que se esforce para criar novas regras, mudar "as regras do jogo".