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É possível liderar a partir de qualquer lugar do planeta

Luciano Coutinho, Engenheiro Mecânico. Líder de projetos de capital e melhoria de negócio em Mineração, Metais e Química.

É possível liderar a partir de qualquer lugar do planeta
Coluna Business Bahia

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09/04/2023 3:00pm

Inquietação foi uma característica minha por muitos anos. Era difícil me manter quieto e serenidade de monge tibetano nunca foi meu forte. Mas as coisas mudam e às vezes acontece de gente assim descobrir como canalizar e distribuir tanta energia. 

Nasci numa gestação de pouco mais de sete meses, e ao longo da vida terminei levando isso muito a sério, talvez mais do que fosse possível lidar. Minha energia não cessava, foi assim quando, por curiosa experimentação, queimei o tapete de casa, testando quanto o fogo realmente depende do oxigênio. O tapete estava no pátio do sobrado colonial em que eu morava, eu estava então com sete anos, na cidade de Cachoeira, no Recôncavo da Bahia.

Foi parecido com incendiar aquele tapete que, aos 15 anos, me mudei para Salvador, deixando a casa de meus pais para estudar na Escola Técnica Federal da Bahia, onde havia sido aprovado, junto com apenas 10 outros colegas, naquele primeiro semestre de 1989. Morei no início com familiares, como era então de costume, e com pouco mais de dezessete anos, eu e meu irmão, então com dezenove, nos mudamos para o Rio Vermelho, num apartamento aconchegante, onde cabiam duas camas de solteiro, e alguns outros detalhes. Continuei inquieto por todos os lugares por onde passei, desde muito cedo decidi que queria trabalhar com empresas líderes em seus segmentos. A liderança sempre foi um tema que me instigava e eu precisava me sentir desafiado o tempo todo.

No mesmo ano da conquista de morar por minha conta eu entraria no curso de Engenharia Mecânica, na Universidade Federal da Bahia. Alguns anos depois começaria minha carreira de engenheiro, no que estava se transformando na gigantesca AB Inbev. Continuei inquieto, migrando em pouco tempo para a líder mundial de processamento de documentos, a então quase imbatível Xerox, com seu icônico centro de pesquisa de Palo Alto, vizinho à Universidade de Stanford, onde anos mais tarde encontraria finalmente meu caminho. Nesse meio tempo, enquanto liderava a área de Engenharia de Processos e Projetos da Xerox, concluí minha pós graduação em Finanças na FGV, e meu Mestrado em Engenharia na Universidade Federal da Bahia.

Em mais uma experiência envolvendo oxigênio e estamina, resolvi que estava na hora de me ver em outro país e com outras culturas, e sem conhecer direito onde estava me enfiando fui aprovado num programa de Gestão Avançada de Projetos da Universidade de Stanford. Lá me envolvi com temas que sequer imaginava podiam ser parte de um programa acadêmico em gestão de projetos, temas como influência, poder, psicologia social, antropologia, cultura organizacional e tudo mais que Stanford faz de melhor, fora as ciências duras, como disse me disse um investidor, na minha curta jornada de empresário.

Durante um intervalo de tempo, que durou menos do que eu havia planejado, resolvi empreender e montei negócios incríveis, sem contudo ter tido tempo de extrair deles a coisa que os incautos consideram a mais importante nesse mundo. Como empresário voltei para a Califórnia, onde novamente com a Universidade de Stanford, construímos um programa magnífico voltado à transformação digital do agronegócio brasileiro, previsto para lançamento em Março de 2019, quando o mundo começou a viver a primeira grande pandemia da nossa geração. De volta ao Brasil e a multinacionais como Dow e Tronox, trabalhei com times locais e times espalhados por todo o planeta, entre eles Estados Unidos, Canadá, México, Holanda, Irlanda, Inglaterra, França, Austrália, Índia e China. Com alguns destes times fizemos projetos incríveis, onde meus erros me ensinaram talvez muito mais que meus acertos.

Nas jornadas que me trouxeram até aqui aprendi que liderar é criar lugares onde as pessoas sejam despertadas para o que têm de melhor, para que sejam protagonistas de suas histórias, e que com isso gerem riqueza, num sentido amplo, criando algum legado para o mundo, independente de sua amplitude geográfica. Hoje passo a maior parte do meu tempo ajudando na gestão de portfólios de projetos e na transformação de culturas. Enquanto isso, sobra algum tempo para criar junto com o time novos empregos, renda e outros bons resultados de negócio. A engenharia ainda está presente, mas como parte da paisagem, me importo mais com as pessoas, e o quê de mais incrível elas podem conquistar. Hoje vivo no litoral norte da Bahia, perto de meus dois filhos, de minha esposa e de meus amigos, perto do mar que por gostar tanto de mim, já quase me levou. Vivo ao sabor do vento nas palhas dos dendês, vento que me impulsiona, como me impulsionam a minha curiosidade e minha quase domada inquietação.