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Caminho sustentável

Georges Humbert, advogado, professor, empreendedor, presidente e fundador do Ibrades, é pós-doutor em direito pela Universidade de Coimbra, em Portugal

Caminho sustentável
Coluna Business Bahia

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15/12/2024 1:00pm

Muitos me perguntam como me tornei um profissional da área de Sustentabilidade, há mais de duas décadas, quando o tema ainda não era tão disseminado. Um pouco de vocação, os caminhos acadêmicos, a trajetória na advocacia, em cargos públicos, privados e a atividade associativa cidadã, além, de, sobretudo, as direções do nosso Pai, são ingredientes deste processo.

Natural de Salvador, capital da nossa Bahia, aos 16 anos, inconscientemente, já iniciava meus primeiros passos sustentáveis. Isso se deu na medida em que comecei a buscar formas de receita, como vendedor de ingressos e eventos, além de aprendiz e auxiliar de cadastramento na Secretaria Estadual de Saúde, passando pelas ações voluntárias voltadas a pessoas em situação de vulnerabilidade e a paixão e a compreensão da importância da natureza, em especial quando em férias na roça de cacau, ou em saudosos fins de semana em Praia do Forte e Açu da Torre, à época sem energia elétrica, com acesso de balsa e por estradas de barro. Aí, a junção do tripé renda, solidariedade humana e equilíbrio dos ecossistemas já estavam direcionando-me.

Logo depois, inicia uma precoce, mas muito almejada, vida acadêmica jurídica. No ano de 2000, ingressei na faculdade de direito da Universidade Católica de Salvador. Ainda na graduação, em 2004, publicou o seu primeiro trabalho monográfico, intitulado “Inversão do ônus da prova no CDC: momento processual e adequação aos princípios constitucionais e processuais”, o que denota uma preocupação com as garantias individuais e o estado democrático de direito.

Em 2005, mesmo ano em que fui selecionado para cursar o conceituado mestrado em Direito do Estado pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo - PUC/SP, acabei por escolher como tema de pesquisa a ordem urbanística e ambiental, dentro da ordem econômica constitucional, o que aflorou o sustentável que já circulava em minhas veias. Isso culminou na minha contratação como advogado do escritório de meu orientador e eterno mestre, professor doutor Márcio Cammarosano, onde atuei, na prática, com temas complexos e relevantes de direito público, inclusive ambiental, econômico e sociais, culminando com a apresentação de minha dissertação de mestrado, “Função sociomabiental da propriedade”, que mereceu a nota máxima da banca examinadora composta pelos professores doutores Márcio Cammarosano (PUC-SP, orientador), Daniela Campos Libório Di Sarno (PUC-SP, examinadora), Fernando Dias Menezes de Almeida (USP, examinador), Toshio Mukai (Usp) e Diborá Grotti (PUC-SP). 

Outra direção relevante nesta rota foi que, ainda durante o mestrado, passeu a fazer parte do corpo docente, na condição de professor assistente e de auxiliar, da consagrada graduação da PUC-SP e as especialização em Direito Administrativo da PUC/SP-COGEAE, sob a coordenação dos professores doutores Clóvis Beznos, Márcio Cammarosano e sob a orientação científica de Celso Antônio Bandeira de Mello, onde mergulhei, ainda mais, nos temas jurídicos e ponderação equilibrada entre os vetores sociais, econômicos e ecológico, para a mais digna e segura vida em sociedade. 

No ano de 2009, publiquei, pela Editora Fórum, o seu meu primeiro livro: Direito Urbanístico e função socioambiental da propriedade imóvel urbana. Em 2010 me tornou membro efetivo do centenário Instituto dos Advogados Brasileiros - IAB, ano também que fundou e ministrou a disciplina Direito Urbanístico na graduação da faculdade de direito da Faculdade Social da Bahia. A partir de 2011 assumi as cadeiras de Direito Administrativo, de Licitações, Contratos e Concessões Públicas na graduação da faculdade de Direito da Universidade Salvador - UNIFACS, além de integrar o corpo docente, na condição de convidado, das pós-graduações em Direito desta, da Universidade Federal da Bahia e da Universidade Católica de Salvador. Já em 2012, com a tese CONTEÚDO JURÍDICO DAS FUNÇÕES SOCIAIS DA CIDADE, obteve o título de doutor em Direito do Estado pela Puc/SP, sob a orientação do Prof. Dr. Márcio Cammarosano, em banca por este presidida e com a presença dos professores doutores Fernando Dias Almeida (USP), Toshio Mukai, Nelson Saule Jr (PUC) e Ricardo Martins (PUC).

Com essa bagagem, prática e teórica, inseri em todas as minhas atividades, de forma transversal, a necessidade de respostas sustentáveis aos enfrentamentos da vida em sociedade. Seja no exercício da advocacia, nas aulas, palestras, pareceres e cursos, artigos, grupos e orientações de pesquisas, livros publicados, atividades no terceiro setor e associativas, bem como no dia a dia, o racional dos passos, das jornadas, das teses, sínteses e soluções, sempre partem da premissa de que o meio termo, o equilíbrio, enfim, a harmonia entre as variáveis empreendedoras, humanas e naturais precisam andar juntas, pena de desequilibrar e derrubar o tripé que baseia a sadia qualidade de vida para as presentes e futuras gerações: a sustentabilidade.

Importante destacar, ainda, neste processo, que, em determinado momento, mesmo que forjado na iniciativa privada e sem vocação e capacidade para a árdua atividade pública, fiz uma imersão, sempre temporária, e a maioria das vezes de forma voluntária, nesta. Fui membro do Conselho Nacional do Meio Ambiente e foi Assessor Especial da Secretaria-Geral da Presidência da República, fui do Grupo de Modernização e Reforma do Estado do Governo de Transição da Presidência da República, foi Assessor Especial da Presidência dos Correios, Superintendente de Patrimônio da União na Bahia, Superintendente de Políticas Públicas de Goiás, Membro da Camara Florestal da Bahia e do Brasil, Membro do Conselho da Reserva da Biosfera Mata Atlântica, entre outro, sempre pautando a da atuação com um olhar tripartite e com instrumentos que hoje são reconhecidos como parte do que se denominou ESG, “environmental, social and governance” (ambiental, social e governança, em português), sem deixar de lado a necessidade de reforma, modernização, simplificação e desburocratização das normas, procedimentos e instrumentos de sustentabilidade.

Outra experiência importante, no mundo corporativo e não jurídico, foi atuar como membro e presidente do conselho de administração do Postalis, um dos maiores fundos de previdência privada do país. Foram diversos percalços, novas formas de agir, decidir, de responsabilidade, de gestão, e tudo mais que vem junto com o mundo corporativo financeiro, em um cargo de alta administração. Ao final, quase quatro anos depois, além de uma contribuição para sustentabilidade da instituição e do aprendizado multifacetado e recíproco, o balanço foi muito positivo, para o Postalis, sobretudo para seus beneficiários, mas, em especial, para mim, fazendo-me amadurecer e evoluir como profissional, como cidadão e e ser humano, com seus acertos, erros e correções se rumo. 

Durante esse curso de vida, profissional e pessoal, percebi, logo, que o mundo nos devolve o que a gente manda, que a gente colhe o que semeia, que as energias se conectam e que aquilo que o Pai lhe concede não deve ficar somente conosco, merecendo ser plasmado. Daí surgem os passos solidários, a difusão do conhecimento, a advocacia social ou pro bono, o voluntariado, culminando por mim unir em propósito a pessoas, profissionais, cientistas, estudantes, professores, empresários, servidores públicos de todo o país e fundarmos o Ibrades, um catalisador e disseminador de práticas, pesquisas, ideias e soluçõs sustentáveis. Destaco, ainda, o ser um voluntário, colaborador do IBCM, instituição que cuida de crianças com HIV ou em convivência e de profissionais do sexo e moradores de rua LGBT, que dá educação, alimento, acolhimento e lar, que constrói ou reforma lares para pessoas em condição de extrema pobreza no interior da Bahia, além de outros serviços técnicos voluntários que prestei e presto a ONG, a organismos internacionais e nacionais e a governos, estes últimos considerados, por lei, de relevante interesse nacional, regional ou local.

Mas, se, agora, depois dos quarenta e olhando toda essa estrada percorrida, eu for questionado sobre o que mais marcou e me fez percorrer, passo a passo, por este caminho sustentável, bem como me ajudou a hoje saber, exatamente, onde, quando e como quero chegar, eu lhes digo: seja voluntário e solidário, você ajudará mais a si mesmo, porém, muito fará pelo todo.